(Talvez também necessárias à Zero Hora e ao prefeito Fortunati)
Texto do engenheiro Vinicius Galeazzi
Sr. Jaime Lerner, antes de sua chegada por aqui, convém o senhor saber, Porto Alegre já existia. E o morro que o senhor descobriu ontem já era conhecido. Veja.
Os índios Arachanes, da família Guarani, viviam nesse morro, hoje chamado de Santa Teresa, junto a um rio que chamaram de Guaíba - lugar onde o rio se alarga = gua (grande) + y (rio) + ba (lugar). Depois vieram os casais açorianos que dizimaram os índios com suas gripes e alguns conflitos. Daí, Dom Pedro II apareceu por aqui e se encantou com o mesmo morro. Mandou construir nele, em 1845, o Colégio Santa Tereza, uma escola para órfãs, em homenagem à sua esposa Tereza de Bourbon, o que deu nome ao morro. O projeto do prédio é do arquiteto francês Auguste Grandjean Montigny, integrante da Missão Artística Francesa, que veio ao Brasil em 1816 e aqui ficou. O prédio, precisa de restauro, é verdade.
Por aí o senhor já pode perceber que já andaram outros arquitetos por aqui, e muito bons. Pois, sabe que ainda tem? Tem outros tantos.
Vamos à frente: Daí, a cidade foi aumentando, açorianos se multiplicando, vieram outros, criaram escolas, o Colégio Parobé, por exemplo, formou excelentes profissionais, depois escolas de ensino superior, de engenharia militar, civil e a de arquitetura formou profissionais de renome. Depois criaram outras faculdade de arquitetura e hoje há muitas no estado. A ditadura militar fez uns estragos, é verdade, mas sabe que os projetos modernistas de muitos deles aqui nesta cidade despontam como referência nacional? E além disso, o senhor não precisa procurar muito para saber de bons trabalhos de urbanismo de arquitetos daqui e de fora, através de um coisa chamada concurso público, promovido pelo nosso IAB. Esse processo de definição de projeto para uma zona da cidade dá legitimidade para o melhor trabalho, através de uma banca constituída de profissionais isentos. Daí, ninguém fica com dúvidas, ninguém critica, pagam, depois, menos de dois milhões por um projeto, bem menos, talvez a metade, ou menos; pois aí, o saber não é notório, mas é de muitos e, por isso, mais perto da excelência, sabe? E sabe que sai mais barato, mais legítimo...Democrático.
Tem mais história: Daí, tivemos uma governadora que quis vender o morro, com mato, prédios históricos, gente e tudo. Com 4 vilas: é bom que o senhor saiba que mora gente lá. Então, esse pessoal reagiu, reagiram também entidades sindicais, ambientais, etceteraetais que a governadora reconheceu a barbaridade que iria perpetuar. Essa gente, em seguida, se uniu e criou um Movimento de Defesa do Morro Santa Teresa, criou uma Carta de Intenções, que é um pacto político que defende esse morro, calcada em três objetivos que são: a regularização fundiária e urbanística das vilas, a reestruturação da FASE e a criação de um parque da área remanescente, para proteger a flora e a fauna e garantir a área para todos os gaúchos, para sempre.
E se quiser saber muito mais coisas da história, do desenvolvimento e do abandono e tantas outras informações desse morro que o senhor gostou tanto, já na primeira olhada, o Movimento, também chamado O Morro é Nosso, tem. Fez um seminário sobre esse tema , em agosto passado, no SENGE daqui, que redundou em material muito rico e, sabe, entre outras coisas, propõe concurso público para o projeto da urbanização de toda a área.
É importante que o senhor saiba, também, que essa terra tem dono, como dizia Sepé Tiarajú. Não é da prefeitura. É da FASE, do governo do Estado. E são 74 hectares, não é pouco. O Movimento, desde que assumiu a atual administração do Estado, tem acompanhado, quanto possível, o desenvolvimento de projetos das Secretarias referentes aos três itens. E lhe informo que o Governo já tem estudos para um parque nesse morro e, parece, propõe concurso público para a urbanização da área que envolve regularização fundiária, parque, valorização dos prédios históricos, etc.
Então, pelo que vi no jornal, o senhor estava passeando pela orla, de repente, olhou para o lado e viu um morro maravilhoso e disse: Oh, que belo, façamos nele três tendas, uma para Isaac, uma para Jacob e outra... A outra, daí lembrou-se da sua pedreira de Curitiba e teve a ideia criativa de imitar e fazer a mesma coisa, um auditório na saibreira. É bom que o senhor saiba que não é a mesma: a vista da saibreira é muito melhor e sua ideia não é original. E lá de baixo, o senhor, pelo que se deduz do artigo, conseguiu ver o antigo ICM – Instituto Central de Menores – da FEBEM, em ruínas, e disse que a FASE pode fazer nele um centro profissional que “as ideias não são excludentes”, pode coexistir com o parque.
Senhor Jaime Lerner, nós respeitamos a sua capacidade, sua história, a sua pessoa. Me permita lhe lembrar que o Morro Santa Teresa, como esta cidade, também tem história, também tem pessoas e também tem gente com capacidade. E concurso público é um bom caminho.
Vinicius Galeazzi
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